A Gestalt-terapia, também chamada de Abordagem Gestáltica, foi criada pelos alemães Fritz Perls e Laura Perls, ambos judeus, e surgiu como uma abordagem psicoterapêutica baseada no existencialismo e na fenomenologia. Suas raízes remontam ao cenário político e cultural da Alemanha nos anos 1920, passando por um período de desenvolvimento na África do Sul nos anos 1940, até ser oficialmente apresentada em 1951, em Nova York.
Nesse período, nos Estados Unidos, ganhava força a chamada "Terceira Força" na psicologia – a Psicologia Humanista – que surgia como alternativa ao Behaviorismo e à Psicanálise. Esse movimento buscava compreender o ser humano como protagonista de sua própria existência, enfatizando a liberdade de escolha e a responsabilidade por suas ações. Dentro desse contexto, a Gestalt-terapia emergiu como uma abordagem centrada no autoconhecimento, no crescimento pessoal e na capacidade de cada indivíduo de se autorregular e conduzir sua vida.
No Brasil, a Gestalt-terapia chegou nos anos 1970, inicialmente em São Paulo, e hoje é amplamente difundida no país, sendo ensinada em diversas universidades e adotada como base teórica em cursos de especialização e pós-graduação.
A história de Fritz e Laura Perls está diretamente ligada às bases teóricas da Gestalt-terapia. Durante a década de 1920, Fritz concluiu seu doutorado em neuropsiquiatria e trabalhou com Kurt Goldstein, criador da Teoria Organísmica. Foi nesse período que conheceu Laura, que havia se doutorado em Psicologia da Gestalt. O casal teve contato com influentes pensadores do Existencialismo e da Psicologia da Gestalt, tornando-se analistas didatas.
Com a ascensão do nazismo, mudaram-se para a África do Sul em 1934, onde fundaram o Instituto Sul-Africano de Psicanálise e tiveram contato com Jan Smuts, criador do conceito de Holismo. Nessa época, publicaram Ego, Fome e Agressão (1941-1942), um livro que já apontava para a integração de diferentes influências teóricas que mais tarde fundamentariam a Gestalt-terapia.
Devido às dificuldades do pós-guerra e ao incômodo com o apartheid, Fritz e Laura mudaram-se para Nova York e, em 1950, formaram o chamado "Grupo dos Sete", que deu continuidade ao desenvolvimento da abordagem. Em 1951, junto com Paul Goodman e Ralph Hefferline, publicaram o livro Gestalt Therapy, formalizando os princípios teóricos e metodológicos da nova psicoterapia.
O termo "Gestalt" vem do alemão e pode ser traduzido como "configuração" ou "forma", referindo-se à ideia de que a percepção e a experiência humana devem ser compreendidas como um todo organizado, e não apenas como a soma de partes isoladas. Esse conceito é essencial para a Gestalt-terapia, que integra influências da Psicologia da Gestalt, da Teoria de Campo, da Teoria Organísmica, do Holismo e da Psicanálise.
A Gestalt-terapia parte do princípio de que o ser humano é um ser de escolhas e que sua existência é moldada por suas decisões. Ao reconhecer sua responsabilidade por sua própria vida, ele deixa de ser apenas um personagem passivo e assume o papel de autor da sua história.
Essa abordagem vê o ser humano de maneira integrada, considerando suas dimensões biológicas, psicológicas, sociais e espirituais como um todo indivisível. O indivíduo está sempre em relação com o ambiente e só pode ser compreendido dentro desse contexto, pois seu comportamento se manifesta na interação entre ele e o meio.
Segundo Perls, o significado da experiência não está apenas nos elementos isolados que a compõem, mas na maneira como eles se organizam. Essa organização ocorre na chamada "fronteira de contato", onde o "eu" se relaciona com o "não-eu" – seja outro indivíduo, o ambiente ou até aspectos internos de si mesmo.
Outro princípio fundamental é a homeostase, que se refere à tendência natural do organismo para a autorregulação. A Gestalt-terapia descreve esse processo como o ciclo de contato, que envolve a identificação de uma necessidade, sua mobilização, ação para satisfazê-la e, por fim, a finalização do ciclo, permitindo que novas necessidades emerjam naturalmente.
Um conceito central na Gestalt-terapia é o de awareness, frequentemente traduzido como "consciência", embora seu significado seja mais amplo. Awareness refere-se a um estado de percepção plena do que está acontecendo no momento presente – tanto internamente quanto no ambiente – com envolvimento sensorial, emocional e cognitivo. O objetivo da terapia é ampliar essa capacidade de percepção, permitindo que o indivíduo compreenda melhor suas experiências e faça escolhas mais autênticas.
A mudança, segundo a Gestalt-terapia, ocorre pelo que é chamado de teoria paradoxal da mudança: para transformar-se, a pessoa deve, primeiro, aceitar e se apropriar do que ela realmente é, em vez de tentar se encaixar em um ideal imposto ou forçado. O terapeuta tem o papel de incentivar o cliente a explorar sua experiência presente e a assumir sua própria existência.
Originalmente concebida como uma abordagem psicoterapêutica, a Gestalt-terapia pode ser aplicada tanto individualmente quanto em grupos, casais ou famílias. Pode ser utilizada em processos terapêuticos longos ou breves, desde que o terapeuta consiga estabelecer uma relação autêntica e acolhedora com o cliente.
Além da clínica, a abordagem tem sido amplamente adotada em contextos organizacionais, hospitalares, educacionais e comunitários, incluindo a chamada Gestalt-pedagogia.
Na prática terapêutica, a Gestalt-terapia se baseia no método fenomenológico, que busca compreender as experiências do cliente sem interpretações prévias, focando na descrição do que ocorre no momento presente. O terapeuta adota uma postura aberta, suspendendo julgamentos e permitindo que o significado das experiências emerja no encontro com o cliente.
No entanto, mais do que um conjunto de técnicas, a Gestalt-terapia é uma postura diante do ser humano. Como afirma Ginger (1995, p. 18), "não se trata de compreender, analisar ou interpretar os acontecimentos, comportamentos ou sentimentos, mas de favorecer a tomada de consciência global da forma como funcionamos e de nossos processos".
Para ser um Gestalt-terapeuta, é essencial, antes de qualquer técnica, ser uma pessoa disponível para o encontro genuíno com o outro. A relação terapêutica é, acima de tudo, um espaço de presença, acolhimento e autenticidade.
Em breve novas novidade!